Uma Pessoa Feliz

E como se pode encher o coração?

Ser constantemente feliz será possível?

Ah! Mas há outra pergunta prévia:

Será que eu quero mesmo ser feliz?

Tenho verdadeiramente sede dessa alegria

que o meu coração anseia?

O que é que faço,

O que é que tenho feito,

E o que é que estou disposto a fazer

na minha vida para a procurar?

Ou, se já a encontrei,

o que é que estou a fazer para a conservar?

Hoje vi uma pessoa feliz,

Sinceramente feliz:

Feliz de gratidão,

Feliz por ter encontrado o que desejava,

Feliz por ter conservado o que encontrou.

Porque se pode ser feliz,

sozinho, sem ninguém,

Feliz na verdadeira solidão,

Quando o coração já não bate... voa!

Querer! Desejar! Ansiar! Pedir! Rezar! Suplicar!

Ter sede e saber que há água

Ter fome e saber que há comida

E que o banquete da alegria é aqui tão perto!

Há uma festa constante em nossa casa

E estamos convidados a brindar quando quisermos:

Por que razão vagueio por todos os quartos

e não entro no salão da Alma,

nesse aposento onde a dança não tem fim?

Hoje vi alguém que abraçou o seu coração.

Alguém cujas palavras eram música

que brotava do fundo do seu ser.

Alguém que teve a humildade de pedir para ser ensinada

e aprendeu a secreta oração do júbilo constante.

Alguém que se libertou de medos e temores

para mergulhar no oceano vivo de misericórdia.

Alguém que aí estava unida à sublime maravilha:

a consciência pura de existir...

Jai Sat Chit Anand!

É esse o alicerce:

O vento, a brisa, o sopro

que entra e sai sem eu reparar;

O ar que nada é e é a fundação mais firme;

A simples atenção ao suave milagre

que me continua a manter vivo.

Cá dentro reside o sentimento a que chamamos “coração”.

Aqui mora tudo o que sempre procuramos

e em mais lado algum podemos encontrar.

É em nós que o segredo derradeiro se revela:

“Olhei então para o meu coração e foi aí,

onde Ele habita, que O vi;

Não se pode encontrá-Lo em nenhum outro lugar.” *

Eu também aprendi a olhar para o coração,

A ser consciente do vai e vem

(O balouço interior!),

A acalmar o fluxo incessante de pensamentos e dúvidas,

A esperar, a aceitar, a entregar-me ao Seu Poder,

Confiando n’Ele, sempre n’Ele e só n’Ele!

O meu sonho realizou-se:

Nada mais espero senão a Felicidade.

Em mim desabrocha o íntimo sorriso misterioso

Que muitos querem compreender,

Mas tão poucos estão dispostos na verdade a conhecer.

Quem me dera dizer nada e sentir tudo!

Ah, mas falo ainda tanto e sinto tão pouco...

E este pouco de tão imenso satisfaz-me,

E deste pouco preciso muito,

Todos os dias um pouco mais,

Uma batida mais, um alento mais, um sorriso mais.

Segredo tão doce e simples!

Que ainda esperas para o conhecer,

Se fora dele já nada tens a esperar?

Ou julgas que o teu coração alguma vez

Baterá por outro amor além do Amor?

Agora é o tempo: agarra a ocasião!

Abraça-o, prende-o muito de força,

Segue-o por todo o lado para onde ele te arraste,

Mas não largues nunca o teu único anseio,

O mistério contínuo que alto ou baixo te diz:

“EU QUERO SER FELIZ!!!”

Porto, 09-07-1998

* Jalaluddin Rumi (místico sufi do séc. XIII)

Rui leprechaun
Enviado por Rui leprechaun em 05/12/2022
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