Lembranças de nuvens.

Havia uma nuvem pintada

Numa parede da minha infância

Eu olhava pra tela e pensava

Que nuvens pintadas não chovem

Não se movem com o vento

Não matam a sede e nem fazem crescer as flores

Passa o tempo, isso arrepia!

As pessoas partem noutras nuvens frias

E as imagens que trazemos

Vivem à margem dessa nossa realidade

Mas, como eu disse, o tempo passa

Enquanto isso, nós passamos juntos

Apesar de juntos, sós

As nuvens de verdade, elas choveram todas

Num ciclo eternamente interminável

O mar arrebenta

Mas aquela velha amiga nuvenzinha

Ainda ostenta a mesma idade

Meu Deus, se ela me visse agora

Talvez fosse a vez dela, então, se perguntar

Por que é mesmo que as pessoas choram

Por que o tempo não demora um pouco mais

Mas, cada coisa tem o seu lugar

no espaço e no tempo

Hoje, logo cedo, os dois sairam pra brincar

Lembrança guardada

Se meus braços te alcançassem

Se hoje meus olhos te vissem

Como a vejo em meus olhares

Hoje eu te diria, minha amiga nuvem

Que é bem pouca a diferença

Nessa dimensão, cá onde estou

O tempo lento passa mais depressa

Chego mesmo a ter a impressão

Que ele, cruel, nos atravessa

Enquanto isso, você

No perene silêncio do seu céu de nuvem pintada

Atravessou comigo um universo e a vida

Choveu nos meus dias

Regou sim, muitas flores

Em cada poesia que eu lia, era ela

Soprando, nos ventos que as moviam

E foram muitas as sedes saciadas

Sim, de alguma maneira e apesar da distância

Também veio junta

Desde aquela vez, na infância

Pois não há nada na vida

Cuja função seja nada.

Edson Ricardo Paiva.