DISTANTE PROXIMIDADE
Aquela casa no meio do sertão
Cortou meu coração
Não tinha mais que um metro e meio
E sem jeito o sertanejo
Se curvava na entrada
Parecendo um ritual de devoção
O que pra nós poderia ser uma casa
De bonecas
Dessas em que as crianças fazem
Suas ingênuas descobertas
Parecia ser uma casa de verdade
Com gente de toda idade
No meio do sertão
A seca com sua presença
Exige que sejamos irmãos
Ou então vem a doença
Que aumenta ainda mais a seca
Em forma de ambição
Oh! Casinha de palha
Com criança descalça
Vendo admirada
Aquela gente esbranquiçada
Montada no cavalo da civilização
Quantas peças de roupa tens em sua mão?
Ainda hoje vi um daqueles cartazes
Cheios de inflamação
Nele se perguntava
Onde está Deus pai da criação
Se a fome e a miséria
Consome o coração
O que não se nota
Ou o que não se importa
É que Deus reside
Justamente nessa grande indagação
Que nos faz ver o outro
Como próximo e ver o próximo como irmão
Nossa! E como ventava nesse sertão
E o mesmo vento que refrescava
Punha em risco a casa de palha?
Que poderia ir ao chão!
E o mesmo vento que soprava
Punha no rosto um sorriso
Que fazia daquela criança
A mais rica esperança
De que a vida desafia
Desafia ela mesma e todas certezas
O sertão não é uma prisão
É antes de tudo um mundo
Leonardo Daniel
in: Ventos da Alma (publicado)