Oferenda
Eu me dou para a Vida
Mesmo no corpo
Sucateado
E a história
Parte dela contada
Eu me dou para a vida
Mesmo no corpo
Com as pernas lentas
Os pés
Semi-dormentes
Eu me dou para a vida
Mesmo que a lógica
Aquietou
Porque ainda não achou jeito a dar
Para o mundo
Eu me dou para a vida
Mesmo que o que tenho
É somente
Eu
As palavras
E os versos em prosa que emito
Levando ao exaurimento da dor
E a renovação dos votos
A rendição à existência
Ofereço-me
A ela
Despudoradamente
Mesmo que o corpo que habito
Não funciona na perfeição
Como quando do meu nascimento
Eu me dou
Para mim mesma
Como oferenda
À razão que uso
Como instrumento
Na câmara secreta do meu ser
Eu me dou de presente
No veladouro de mim mesma
Essência ígnea
Sem véu
Tudo que tenho
Como sendo
Eu e o mundo
Aquilo que me acompanhará
Como testemunha de mim mesma
No último suspiro
Prova e contraprova
De tudo que fui
De palhaça e juíza
Sábia e ingênua
Personagem e platéia
Indemonstrável
Intransferível
Inalienável
Incomunicável
Somente meu
Aquilo que excede
Meus fracassos
E sucessos
Do que o outro
Diz eu ser
Em lucros e perdas
Vitórias e derrotas
Segredos e fofoquices
Verdades e mentiras
Que carrego
Degustação de uma nota
Só, luminosa
Nem o Dó, muito menos as demais
Nem o que vem depois da última escala musical
Vivo a execução da música