Monte Athos
Disseram-me:
“Lança tuas vestes
a túnica, o manto e quanto mais tiveres
ao vento e ao sal.”
Em mim se repete
o gesto original, nova nascença
de útero amplo como o sol.
Disseram-me além:
“Esquece a escritura, quando a aprenderes;
a letra é uma carga e um laço estreito
- o universo, lembra-te, é teu leito”
E eu segui, de pés descalços e palavra
exausta, por desfiladeiros de mim.
“Harpias e dragões hão de encontrar
teu sono e teu peito escavar
quantas dores julgares esquecidas” –
Eis o que disseram também.
Por dragões e por harpias fui tocado
E era tanta noite e a solidão tamanha
Que as dores, por força destas lágrimas
Crisântemos tornaram-se, e campânulas.
“Abandonado serás por Deus e pela Deusa;
Anjos verás que não serão consolo. Paciência tende."
Disseram-me à alma tão retesa
Paciência eu tive.
Vi anjos que pintei de ouro
E na lama por fim me abandonaram.
Deus não me escutava
A Deusa não me ouvia
Além de minha miséria - nada havia.
- A alma de tal homem para o inferno pende!
(Assim pensava, de alma tíbia, peregrino)
“Cala-te, insensato! ” Isso eu ouvia
quando o vento do deserto sibilava.
“ O inferno é o amor agrilhoado
Nas correntes que tu chamas de ‘Eu mesmo’.
Suas chamas são as flamas que consomem
O que retém o rouxinol em cativeiro. Deixa-te queimar.
Em breve tua alma
Será de luz e leve como o ar."