O mistério de Jechidah

(O poema conta a história de Jechidah, uma alma feminina condenada ao Sheol (um lugar de constante desespero) por blasfêmia. Ela é enviada para a Terra para cumprir sua condenação, e lá ela nasce como uma criança, sem lembrar de sua vida anterior. Ela cresce na Terra, experimentando o amor e o sofrimento, até encontrar Jechid, que a faz lembrar de sua vida anterior e da verdadeira natureza da existência. No final, Jechidah percebe que a vida na Terra é ilusória e que há uma eternidade e um propósito maior para a vida, que envolve dor e sofrimento como instrumentos divinos para completar a obra prima do Senhor. A história termina com a chegada da filha de Jechidah, que está prestes a morrer e ser enterrada na Terra.)

(Inspirado no conto de Isaac B. Singer)

No Sheol, um'alma feminina,

Em constante desespero,

Qual monturo de rapina,

Aguardava o próprio enterro...

Deixou seu amor Jechid,

Partiu cedo: saudades!

Um ramalhete de flores,

Um adeus à eternidade!

Num túmulo chamado ventre,

Em um planeta, - a Terra.

Lugar onde a Alma vivente,

Toda a esperança encerra.

Seu nome era Jechidah,

O seu pecado: blasfêmia!

A pior condenação que há

Ser encarnado na Terra.

À Suprema Corte Celeste

Foi oposta a apelação...

Nada feito! Ela desce...

Vai cumprir a condenação!

Pois além de ré confessa,

Não clama por salvação...

Cumpra-se a pena depressa!

Que comecem a gestação!

Os serventuários celestes,

Tomaram Jechidah pela mão,

Lha despiram d'alvas vestes...

Cortaram-lhe cabelo e gibão.

Alijada da celeste Glória,

Que coroa o firmamento,

Apagaram-lhe a memória,

Jogando-a no esquecimento.

Plantada em um ventre podre,

De um breu muito profundo,

Tentou fugir, mas não pôde...

Já pertencia a este mundo.

Diante de Jechidah,

Pôs-se o Anjo da Morte...

Tu serás uma criança,

Essa será a tua sorte...

Haverá uma esperança,

Em uma centelha ainda.

Deus revela sua presença

Em cada pulsar de vida.

- Sentes arrependimento?

- Su'alma está contrita?

- Não! Só tenho um lamento...

- O não pecar mais ainda!

(Respondeu com rebeldia).

Após um silêncio breve,

Disse o Anjo complacente:

- Que o véu da morte te leve...

Ao mundo mais decadente.

À escuridão mais profunda...

Onde a dor a Alma cura,

Onde o sofrimento abunda

E o pecado se depura.

Jechidah sentiu medo,

Profunda solidão e frio...

Ladeada por Queronte

E transpondo Estige, o rio

Ao entrar num beco bem estreito

Jechidad chorou copiosamente

Sentindo-se acolhida a um peito

Sugou uma seiva agridoce, leite!

No mundo do sofrimento

Sentiu-se tão acolhida...

E brotou-lhe um pensamento:

- Isso não é morte! É vida!

Ao experimentar a ternura,

Na Terra de muitas cores...

Na infância ingenua e pura,

No despertar dos amores...

Jechidah sentiu-se amada

Envolta em luz e riso...

E de nada se lembrava...

A Terra é um paraíso!

Aqui viveu mil encantos

Se embriagou dos amores

Se entregou aos acalantos

De muitos cortejadores

Até que um, o Jechid...

Dos outros era difetente!

Tocou-lhe a mão e a Alma,

Seria dele....pra sempre!

Jechid? Sim Jequidah...

Você crê em outros mundos?

Que possa existir um lugar

De liames mais profundos?

Um lugar de completa dor,

Ou de viver pleno e eterno?

De puro ódio ou de amor...

Existirá o Céu ou o Inferno?

Jechid rompeu-se em riso...

Que outro mundo Jequidah?

Aqui é o inferno e o paraíso...

O agora é tudo o que há!

Tudo é vibração da matéria.

O fim será na sepultura...

Tudo o mais é quimera...

Meras e vazias conjecturas.

De súbito Jechid a beijou...

Num carinho tão envolvente

Que Jequidah se entregou

Abrindo-lhe a Alma e o ventre...

Jequidah fechou os olhos

Mergulhando em si mesmo...

Ouvindo o som de ferrolhos,

Pensou...estarei no limbo?

Cavalos trotando devagar...

Lamentações da morte, uivos

Trinos, zumbidos e o crepitar

Dos seus próprios ossos...

De um sobressalto despertou...

Estava no mundo de outrora

Sua Alma também acordou

Sentiu que chegava a hora

E reconheceu toda a verdade

Que a vida na Terra é ilusória

Mas que existe a eternidade

Que há um liame na história

Que o sofrimento é o Caminho

Que o Senhor lapida e ensina

A dor é um instrumento divino

Para completar sua obra prima

Ao lado de Jechid viu uma fila

De almas que desciam à Terra

Dentre elas uma era sua filha...

E ouviu uma voz que berra:

O Cortejo já se aproxima,

Prepare a tumba, coveiro!

O defunto é de uma menina...

Comecemos logo o enterro!

Kleber Versares
Enviado por Kleber Versares em 12/08/2019
Reeditado em 11/04/2023
Código do texto: T6718825
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