O murmúrio das pedras
Nesta era dos clamores febris
Do mundo suicida e das vidas que restam,
Vale a pena mergulhar no murmúrio das pedras...
Escutar maravilhas no gargalhar do silêncio.
Medir o som que exala da terra em cânticos de perdão.
Saborear o deslizar das águas cada vez mais gentis
Que teimam em lavar os nossos corpos que sofrem.
Somos cada vez mais um bando de trogloditas,
Hermafroditas no desejo de profanar a tudo e a todos.
Hipócritas que rezam, choram, riem e se matam.
O parco pó que nos segura não vai durar para sempre...
Alegrias sem sentido não purificam o nosso coração.
Ainda estamos a tempo de renunciar à dura eutanásia.
Podemos ainda segurar o nosso corpo que estremece.
Dá tempo de cavalgar as colinas dos nossos sonhos.
A altivez da morte é uma ameaça que nos enfraquece,
Cavaleiro negro que nos observa para lá do infinito...
A vida é muito mais do que uma fogueira de vaidades.
A cova que nos vai engolir é feita dos restos da humanidade.
Ainda há tempo para degustar o sol, a chuva e as cascatas.
Acordar ao som dos pássaros e no sibilar das matas.
Renunciar, com alegria, àquilo que não foi feito para nós.
Achar um outro horizonte aprazível, mais digno e justo.
Semear o nosso chão com ossadas antigas e eloquentes.
Pertencer a essa terra de ninguém que nos quer bem...