QUEM SABE, UM DIA....
...de carona
Pelas asas da poesia
Eu volte
Só para olhar.
Como flor recém florada
Ainda que podada
Da alvorada do viço ido
Eu volte
Como primavera que rebrota no todo.
Só para auscultar o passaredo livre,
No enlevo do horizonte
Pulsante que chega
Vindo das incertezas
Ao também rumo do não sei onde
Pelas suas rotas brincalhonas.
Quem sabe, um dia
Eu volte
Só para aquele café passado
Perfumado com o odor do que fica
Coado ali, de repente
Na mesa posta em festa
Para a ingenuidade
De degustar todos os sumos!
Bem rapidamente...
Depois de brindar e segurar
A imobilidade das horas.
Quem sabe,
Eu pouse e repouse na grama,
Como borboleta flutuante
Lépida e esvoaçante
Saída dum casulo de mistérios...
Na missão de ser
Só um fluido ser
Em leve sobrevoo das superfícies
Sempre alegre por não saber.
E assim eu volte,
Quem sabe um dia,
A despertar de repente
Preguiçosa e desprecavida
Pela primavera da cidade pálida
Sob o batuque das notas das manhãs,
Qual flor urbana acizentada
Que aguarda o jardineiro
Para a milagrosa água da vida.
Quem sabe, então
Num ato de caridade dos céus
A chuva chova
Só por ora,
Distraída da acidez e
Das poeiras dos atos
(E dos descasos!)
E respingue sob todos os pés descalços
A nos encharcar de seiva pura
A nos fazer voltar
Ao refrigério da terra ética
Que nos nutre,
A nos fincar de vez
Em humo nobre.
Quem sabe , um dia
Voltemos firmes!
Eu
E toda a poesia
Das raízes que brotam soltas,
Frouxas para irem,
Só porque sabemos ser assim
Impossível se ficar.
Quem sabe, um dia...
O tempo ,
Andarilho passante,
Esse senhor sisudo, sem cara
Maestro de todas as estações
Do mundo!
Nos dê um tempo
Para que retrocedamos
Em sensatez sensata
Na devida amplitude
Duma primavera a todos nós.
Algo como se ser
Criança agitada
Chapinhando terra,
Ser sempre essência natural
Inseparável do mesmo barro do tudo...
Que só finge remanso aquietado
No crepúsculo do tempo,
Todavia,
Perene horizonte quiescente
De voltar a ser si do que já se foi.
Quem sabe um dia desses
Então...
Eu volte.
Só para me buscar.