SEPULTAMENTO
O ar está quente e rarefeito
Não ouço mais o teu canto
Escureceu dentro do meu leito
Sinto náuseas sem ter pranto
As larvas preparam-se para viver
No meu corpo frio pálido e direito
Querem mutilar-me por dentro
Achar carne dentro do meu peito
A sepultura é a minha última morada
Talhada em pedra sobre o meu feito
Ossos duros seguram-me ao corpo da terra
Imagens imundas lembram-me a guerra
O melhor será morrer já para esquecer
Adormecer sem tarde para não sofrer
Aproveitar essa casa como um abrigo
E dar graças por não ter aqui um amigo
Oferecer-me à importância dessa cova
Que me concede o direito de não ser
Como um parasita inconsciente e mudo
Que não precisa mais de usar as manhas
Despeço-me do mundo sem clemência
Para habitar finalmente nas entranhas
Não quero ser mais cruz nem penitência
Somente preambular sem o meu escudo
Apenas ausência e amor por tudo