A VISITADORA
A morte me visita em todos os meus dias.
e deixa-se estar pairando nas sombras.
Eu a abandono, em espreita, para lhe medir melhor os passos.
Sinto minh´ora chegada, nesta sezão de maleita.
A morte, como ninfa apaixonada
insistente e mordaz na arte
vem na manhã, como pomba, à noite, corvo,
crocitando a minha sorte.
Acompanha-me servil por toda parte.
Faço que não a vejo. Também, não lhe digo o nome.
Mundana do centro, passando bem rente
de mim, sussurra-me ao ouvido
a propor-me um bailado indecente e insone.
Às vezes, lentamente, outras vezes, nem tanto
toma-me pela mão e com todo o espanto
deixo que me conduza na dança leve da desintegração.
Sei que na hora certa se irão as idéias
concatenadas, as poesias declamadas
ir-se-ão os afetos esculpidos, também,
as terrenas coisas e as fantasmagorias celestes.
Não mais belezas para revisitar.
Não mais bons livros para reler, boas safras para beber.
Não mais mar. Não mais sexo. Nem mais prazer.
Morrer é uma coisa tão fria.
Ah..também, não mais graças
para alcançar, por intersecção de Maria.
Tudo se esvai. As importâncias e o desinteresse.
O poder e a filosofia.
Tudo se esvai como que pelo ralo da pia.
Então, deixo-me flertar com a dama dos sepulcros
que chega na noite fria, com a maciez de nuvem
de sua tez tão alva, de palidez mortuária.
Seduz-me a sua mórbida presença e letargia
que brilha na noite branca e solitária.
E uma morte apenas não basta
como também não basta um só amor.
Quantas mortes pela vida? Quantos, os amores circundantes,
zumbis, permanências insepultas?
Dos lábios da morte, eu quero a prova dos tremores frios
fremidos nas profundezas da profanação.
Quero, por fim, la petite mort
o eterno gozo que virá com o prazer do ultimo suspiro,
fundo, breve, mas, parteiro da renovação.