O limiar da aurora (a peregrinação II)
Continuaram a peregrinação os dois seres-sendo, em passos de consciência e de ruptura, e entram no cemitério dos ídolos caídos. Quando dos céus irrompe a voz serena do silêncio, do vazio e do Nada. Dizendo sem falar:
Escrevo de um cemitério, de onde o mito caí
Minha presença abre meus olhos que se embaçam
Na aurora do abismo e de toda queda daquilo que nos traí
Estou onde a matéria projeta as sombras que passam
Se quem vos fala fosse mais socrático, acharia agora um amor
Fosse Byron escrevendo diria que o tédio me deixou onde estou
No entanto não há Byron na presença helenística que narra a dor
O meu mal é consciência na partida do sonho que me deixou
Minha potência desperta e encara quem interpreta, meu sendo ser
E confessa ao pé do ouvido que criou tudo aquilo que cri
Que me fez idealizar tudo aquilo que amei, e que fez por prazer
A consciência de onde falo desperta do escapismo, e do sonho de ti
Toda a tragédia grega, toda simbologia, tudo que era sólido desfez
Reconheci que amei só em ideia e a vil matéria me trouxe sensatez
Cá estou poeta materialista e cientista romântico, encarando a presença
Qual a razão disso, desse tipo de compromisso com destruir tudo que amei?
Fez por prazer e é tudo que me diz e agora abro os olhos no crepúsculo do abismo
Enfim, posso tocar a minha consciência em livre demência, e refazer tudo que sei.
Assim declamou Dasein, o poeta da existência.