Cruz e Sousa – o cisne negro

Poemas de Cruz e Sousa

Filho de negros alforriados, João da Cruz ficou sob tutela da família do militar Guilherme Xavier de Sousa.

Recebeu boa educação e combateu arduamente a escravidão e o preconceito racial no jornal Tribuna Popular."

Veja esses poemas em:

http://www.mensagenscomamor.com/poemas-e-poesias/poemas_cruz_e_sousa.htm

Livre - poema

Cruz e Sousa

Livre! Ser livre da matéria escrava, arrancar os grilhões que nos flagelam e livre penetrar nos Dons que selam a alma e lhe emprestam toda a etérea lava. Livre da humana, da terrestre bava dos corações daninhos que regelam, quando os nossos sentidos se rebelam contra a Infâmia bifronte que deprava. Livre! bem livre para andar mais puro, mais junto à Natureza e mais seguro do seu Amor, de todas as justiças. Livre! para sentir a Natureza, para gozar, na universal Grandeza, Fecundas e arcangélicas preguiças.

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A Morte

Cruz e Sousa

Oh! que doce tristeza e que ternura No olhar ansioso, aflito dos que morrem… De que âncoras profundas se socorrem Os que penetram nessa noite escura! Da vida aos frios véus da sepultura Vagos momentos trêmulos decorrem… E dos olhos as lágrimas escorrem Como faróis da humana Desventura. Descem então aos golfos congelados Os que na terra vagam suspirando, Com os velhos corações tantalizados. Tudo negro e sinistro vai rolando Báratro a baixo, aos ecos soluçados Do vendaval da Morte ondeando, uivando…

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Inefável

Cruz e Sousa

Nada há que me domine e que me vença Quando a minha alma mudamente acorda... Ela rebenta em flor, ela transborda Nos alvoroços da emoção imensa. Sou como um Réu de celestial sentença, Condenado do Amor, que se recorda Do Amor e sempre no Silêncio borda De estrelas todo o céu em que erra e pensa. Claros, meus olhos tornam-se mais claros E tudo vejo dos encantos raros E de outras mais serenas madrugadas! Todas as vozes que procuro e chamo Ouço-as dentro de mim porque eu as amo Na minha alma volteando arrebatadas

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Braços

Cruz e Sousa

Braços nervosos, brancas opulências, brumais brancuras, fúlgidas brancuras, alvuras castas, virginais alvuras, latescências das raras latescências. As fascinantes, mórbidas dormências dos teus abraços de letais flexuras, produzem sensações de agres torturas, dos desejos as mornas florescências. Braços nervosos, tentadoras serpes que prendem, tetanizam como os herpes, dos delírios na trêmula coorte ... Pompa de carnes tépidas e flóreas, braços de estranhas correções marmóreas, abertos para o Amor e para a Morte!

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Alma solitária

Cruz e Sousa

Ó Alma doce e triste e palpitante! que cítaras soluçam solitárias pelas Regiões longínquas, visionárias do teu Sonho secreto e fascinante! Quantas zonas de luz purificante, quantos silêncios, quantas sombras várias de esferas imortais, imaginárias, falam contigo, ó Alma cativante! que chama acende os teus faróis noturnos e veste os teus mistérios taciturnos dos esplendores do arco de aliança? Por que és assim, melancolicamente, como um arcanjo infante, adolescente, esquecido nos vales da Esperança?!

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Antífona

Cruz e Sousa

Ó Formas alvas, brancas, Formas claras De luares, de neves, de neblinas! Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas... Incensos dos turíbulos das aras Formas do Amor, constelarmante puras, De Virgens e de Santas vaporosas... Brilhos errantes, mádidas frescuras E dolências de lírios e de rosas ... Indefiníveis músicas supremas, Harmonias da Cor e do Perfume... Horas do Ocaso, trêmulas, extremas, Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume... Visões, salmos e cânticos serenos, Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes... Dormências de volúpicos venenos Sutis e suaves, mórbidos, radiantes ... Infinitos espíritos dispersos, Inefáveis, edênicos, aéreos, Fecundai o Mistério destes versos Com a chama ideal de todos os mistérios. Do Sonho as mais azuis diafaneidades Que fuljam, que na Estrofe se levantem E as emoções, todas as castidades Da alma do Verso, pelos versos cantem. Que o pólen de ouro dos mais finos astros Fecunde e inflame a rima clara e ardente... Que brilhe a correção dos alabastros Sonoramente, luminosamente. Forças originais, essência, graça De carnes de mulher, delicadezas... Todo esse eflúvio que por ondas passa Do Éter nas róseas e áureas correntezas... Cristais diluídos de clarões alacres, Desejos, vibrações, ânsias, alentos Fulvas vitórias, triunfamentos acres, Os mais estranhos estremecimentos... Flores negras do tédio e flores vagas De amores vãos, tantálicos, doentios... Fundas vermelhidões de velhas chagas Em sangue, abertas, escorrendo em rios... Tudo! vivo e nervoso e quente e forte, Nos turbilhões quiméricos do Sonho, Passe, cantando, ante o perfil medonho E o tropel cabalístico da Morte...

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Ironia de Lágrimas

Cruz e Sousa

Junto da morte é que floresce a vida! Andamos rindo junto a sepultura. A boca aberta, escancarada, escura Da cova é como flor apodrecida. A Morte lembra a estranha Margarida Do nosso corpo, Fausto sem ventura… Ela anda em torno a toda criatura Numa dança macabra indefinida. Vem revestida em suas negras sedas E a marteladas lúgubres e tredas Das Ilusões o eterno esquife prega. E adeus caminhos vãos mundos risonhos! Lá vem a loba que devora os sonhos, Faminta, absconsa, imponderada cega!

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Velho

Cruz e Sousa

Estás morto, estás velho, estás cansado! Como um suco de lágrimas pungidas Ei-las, as rugas, as indefinidas Noites do ser vencido e fatigado. Envolve-te o crepúsculo gelado Que vai soturno amortalhando as vidas Ante o repouso em músicas gemidas No fundo coração dilacerado. A cabeça pendida de fadiga, Sentes a morte taciturna e amiga, Que os teus nervosos círculos governa. Estás velho estás morto! Ó dor, delírio, Alma despedaçada de martírio Ó desespero da desgraça eterna

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Estudos Avançados

On-line version ISSN 1806-9592

Estud. av. vol.18 no.50 São Paulo Jan./Apr. 2004

http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142004000100017

CULTURA

A trajetória do negro na literatura brasileira

Domício Proença Filho

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000100017

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João da Cruz e Sousa, considerado o mestre do simbolismo brasileiro, nasceu em Desterro, hoje cidade de Florianópolis - SC, no dia 24 de novembro de 1861. Desde pequenino foi protegido pelo Marechal Guilherme Xavier de Sousa e sua esposa, que o acolheram como o filho que não conseguiram ter. O referido marechal havia alforriado os pais do escritor, negros escravos. Educado na melhor escola secundária da região, teve que abandonar os estudos e ir trabalhar, face ao falecimento de seus protetores. Vítima de perseguições raciais, foi duramente discriminado, inclusive quando foi proibido de assumir o cargo de promotor público em Laguna - SC. Em 1890 transferiu-se para o Rio de Janeiro, ocasião em que entrou em contato com a poesia simbolista francesa e seus admiradores cariocas. Vivia de suas colaborações em jornais e, mesmo já bastante conhecido após a publicação de "Missal" e "Broquéis" (1893), só conseguiu se empregar na Estrada de Ferro Central do Brasil, no cargo de praticante de arquivista.

http://www.elfikurten.com.br/2012/02/cruz-e-sousa-o-cisne-negro.html

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http://www.elfikurten.com.br/2012/02/cruz-e-sousa-o-cisne-negro.html
Enviado por J B Pereira em 06/01/2016
Código do texto: T5502584
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