TOLLE, LEGE
Hoje descobri que não sou um dinossauro
Esta certeza kafkiana me bateu como uma onda nas pedras
Apesar de andar como um réptil e de cheirar como um fóssil,
E muitas vezes soltar escamas e minha pele,
Hoje me veio esta certeza, olhando fotografias onde não me enxerguei.
Vi as pessoas como manadas apressadas,
Atravessando a África de suas vidas inteiras,
Beirando os poços de águas sujas e fétidas de suas incertezas,
Bebidas aos goles sedentos, sem moderação,
Olhando de esguelha para quem os desacompanha.
“Tolle, lege, tolle, lege” nem precisei ouvir para acordar,
Mas sei que de mim não saiu tal despertar.
Quem me tirou da condição de sauro psicótico?
Não terei mais coragem de andar nas manadas, agora elas me estranham,
Não mais me deixam assentar à roda do fogo.
Os poços já não matam minha sede, já tenho minhas certezas,
Busco agora águas limpas, uma busca assaz solitária.
Ainda não vejo os campos verdes, mas sinto o cheiro das hortelãs,
Não ando na trilha das miríades, não quero companhia,
Porque nem todos aprenderam a voar.