Alma Árida
Uma lágrima panteísta escorre dos teus olhos ambiciosos,
É preciso ser forte e corajoso, mas temos convicções e medicações;
O nosso muito sempre nos é pouco, e nosso pouco é o reino do tédio,
Mas a seara é imensa, e os ceifeiros são tão poucos.
Gotas de sangue transpiram de teu silêncio gangrenoso:
Esse silêncio que quer berrar ao mundo todas as nossas vilezas,
Esse silêncio que almeja a um colo, a um ombro fiel, a um amigo;
Esse silêncio infernal que olha para trás, e só há o barulho do vento.
Um tiro grita da pistola que o adolescente encontrou na gaveta do pai:
Prantos gralham ao redor do caixão do irmão que só tinha cinco anos;
Um amor que mata o dia a dia, uma saudade que corrói a memória,
Bem como nas pontas dos dedos e na fumaça do cigarro não fumado.
Uma igreja que reza silenciosamente no centro do município,
A procissão dos excluídos, indoutos e dos fanáticos pelas ruas do pecado:
O pecado acaricia nossa sede, floresce nossos desejos,
Subjuga nossos pés, e nossos sentimentos são nossas jaulas,
E a procissão dos insanos e sábios despenca nas profundezas do coração.
A lágrima, o sangue, a pistola e a igreja acendem fogueiras em nosso ser,
E o amor é sacrificado com o cutelo pagão
De nossas incertezas monoteístas e cadavéricas;
E as nuvens proclamam: “nunca mais”;
Os cadáveres dos corvos fedem em teus falsos olhos legisladores,
E o Espírito de Deus busca uma alma pecadora,
Mas todos já são campeões justificados.
Tenho uma imensa sede de água e de justiça em cada córrego de meu corpo, mas todas as fontes se afogaram na escassez dessa alma árida e maniqueísta do homem.
Senhor, dá-me amigos verdadeiramente pecadores, mas humanos, Pode até ser idiotas, porém que sejam divinamente humanos,
Pois estou farto de ovelhas bipolares e santificadas por si mesmas.