O Sepulcro da Árvore do Lago

Singular como o tenor da existência

Desce o orvalho pela fronte liquefeita,

Molha a flor da sepultura a gota ardente

E se esvai no espelho a árvore imperfeita

É tão casta a dor que existe em derradeira

Forma, augusta, e esculpida lentamente,

Fora cego o meu olhar e não quis ver

O arcaico no teu corpo inocente.

Foste tu que me puseste a Companheira

pela vida a contemplar o inexistente:

Quando a Paz inebriante do funesto

põe a pérola embebida em céu cadente;

Vejo o amor em tais vestígios de amargos

sons estreitos a fremir meu pasto inteiro,

junto a sina dos elásticos cuidados

que se findam em estáticos coveiros!

As raízes que se fundem com a terra

Chegam vis em teu espaço esquecido

És tu moça, que não flui nem envelhece,

És minério que alimenta o caule insípido.

Culminada numa virgem decomposta,

No degredo do teu peito nada existe:

- Porém - falo - no meu peito, presto, invoco!

Teu olhar me é distante e como insiste!

Oh, memória revoltada dos meus breus

Estocada junto aos ciclos naturais

Dorme casta no furor dos olhos pretos

E caminha pelas curvas dos meus ais

Como um símbolo contrário ao meu apelo

Permanece arrefecida em baixos solos.

Virgem minha, já é outra substância

Que não sente os muitos raios de apolo!

Nessas águas tão serenas mistifico

Tuas mágoas mergulhadas nos volumes

Das suspeitas redondezas com início

Nos abismos que meu ser lembra o negrume!

Sei que a dor teu esqueleto não atinge.

Ora, sei que meu empírico existir

Vive a vida na ciência do que sinto

E teus restos extasiam meu carpir

Lembro as tranças que enrolavam os meus dedos

Nada mais além de ti enrola as tranças,

Todas elas vagam louras na caveira

E teu riso escondido, inerte, cansa!

Dos luares que perdeste ó alva graça

Nada tens senão a Noite e a pele nua

Sendo árida esta terra que te agarra

Dentro dela nem sequer existe lua

Nesta Lua corre o leito decrescente,

leito puro, tão somente é infantil:

O rabisco fermentado pelo incesto

É uma árvore esplêndida e gentil

E teu choro reunido pelas lânguidas

folhas rubras na vertigem dos anelos,

E se escapa, e é viscoso, junto ao âmbar

Teu incenso misturado ao teu cabelo

E as veredas espaçadas pelos líquens

num furtivo desdobrar de várias flores

teus carnívoros micróbios a subir-te

não resistem e esquecem tuas dores

E o sebo da tua pele desprezado

Pelas glândulas cercadas neste húmus,

A persona, num momento, como um Néctar

Sinestésico e tomado pelo fumo

E a fumaça se tornando a própria queda

Do meu eu, desenganado e melancólico,

E o fim desesperado de tal erva

Me põe nulo pela fé do peito eólico

Como preço de poeta das impuras

vezes mortas que o amor, se assim souberes,

Retratá-lo tão cruel pelos sepulcros

Dos delírios que são todas as mulheres!

Heitor de Lima
Enviado por Heitor de Lima em 20/05/2014
Reeditado em 18/11/2014
Código do texto: T4813943
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