PEDRAS NA VIDRAÇA
Ser peregrino de imagens serenas é transportar a morte,
porvindoura à insânia de momentos fugazes.
Ali, naquele pedaço de tempo perdido,
nem havia tanto amor – como se diziam –
entre os amantes que ousaram omitir, com palavras sôfregas,
no arrebol em que se prometiam sempiternamente,
suas soturnas e infaustas essências humanas.
Como num quadro surreal onde se pintam deuses míticos,
condenados por obra de seus criadores perjuros,
podia-se antever o declínio iminente que conduzia ao cataclismo,
após expostas suas máscaras e desmistificadas suas entranhas,
em tropeços inevitáveis entre apócrifas efígies congêneres
com quem se trocavam as mesmas promessas incautas e abissais.
Se fui traído ou intrujado por falsa santa não me digo inocente,
que de seu cerne conhecia antes de seus versejos ébrios.
Se me quedei atuando em falsas posturas como vulto lendário,
não me acabrunho, posto que, como a alva e as demais personificações,
ofusco-me de minhas próprias heresias apodrecidas.
Bem sei que por detrás de olhos esfingeados
se escondem necrópoles vazias,
e que por detrás de autopurezas prédicas e de palavras vãs
residem semblantes distorcidos.
Eu também, vil menestrel que sou, incapaz de ser impermisto
ou de exteriorizar as chagas que me cerneiam,
libero meu pensamento que voa perdido rumo a esperanças amortalhadas,
nos inóspitos caminhos onde frutificam quimeras ávidas a todo momento,
sabendo também que, ao despetalar do que não se pode ser inteiro em leitos lenitivos,
restam impérios devastados a tentarem se reeguer
entre dores, amores e crenças congênitas,
alicerçadas nas mesmas bases frágeis de si mesmos
e condenados às mesmas quedas em venturas porvires.
Péricles Alves de Oliveira