CÂNTICO DE SALOMÃO
(A MOÇA - em versos decassílabos)
“Oh! Beije-me ele com todos os beijos
de sua boca... pois tuas carícias
são bem melhores que quaisquer dos vinhos.
O olor de teu perfume é só delícias!
Teu nome é como um óleo que despeja...
Por isso, as moças amam teus carinhos.
Oh! Puxa-me contigo, e então, corramos!
O rei me introduziu no mais recôndito
dos aposentos do palácio, e entramos.”
(AS FILHAS DE JERUSALÉM - em versos octossilábicos)
”Ó rei! Em ti, rejubilamos!
Seja esse amor concelebrado!
Melhor que o vinho que provamos,
és, com razão, ó rei, amado.
(A MOÇA)
”Eu sou uma moça negra, mas sou linda,
ó filhas de Jerusalém! E preta quão
as tendas de Quedar, e como os panos
das pretas tendas do Rei Salomão.
Oh! Não olheis pra mim, pois sou trigueira,
e o sol de mim gostou ao me avistar.
Zangaram-se comigo os outros filhos
de minha própria mãe e, em seu lugar,
me designaram guardiã das vinhas,
embora eu já tivesse meu vinhedo.
Para cuidar da deles e da minha,
eu tinha sempre que acordar mais cedo.
Conta-me tu, a quem minh’alma amou!
Pois, fico imaginando onde estarias?
Onde é que pastoreias? E onde fazes
o rebanho deitar-se ao meio dia?
Por que é que eu deveria me tornar
igual a uma mulher com luto e dores,
sem ter coragem de te procurar
entre as ovelhas dos outros pastores?”
(O REI)
"Se tu não sabes, ó mais bela entre as mulheres,
segue as pegadas dos rebanhos. Quando fores
apascentar as cabritinhas que trouxeres,
tu me verás perto das tendas dos pastores.
Te olhando, comparei-te a uma égua minha
puxando os carros triunfais do Faraó.
São lindas tuas faces, companheira minha!
Tranças dos teus cabelos moldam seu redor.
Em teu pescoço, as contas de um colar poremos
e entre argolinhas de ouro, ao longo, atacaremos
botõezinhos de prata raros, do melhor”.
(A MOÇA)
"O rei se assenta à mesa e tem sentido
meu nardo perfumando os seus rodeios.
Qual saquitel de mirra, o meu querido
há de passar a noite entre meus seios.
Ah! Meu querido! semelhante a ti
são cada cacho de hena que há em meio
aos floridos vinhedos de En-Gedi."
(O REI)
"És bela, eis que és tão bela, ó companheira minha!
Teus olhos meigos e suaves lembram pombas
que pousam, dóceis, todo dia em minha vinha."
(A MOÇA)
"Eis que és tão belo, meu querido! A imagem
tua é tão boa pra se contemplar!
Também, nosso divã é de folhagem.
As vigas são de cedro em nosso lar,
e os caibros, dos pinheiros da paisagem".
(A MOÇA)
“Eu sou somente um açafrão de uma planície
em costa ao mar, um lírio das baixadas."
(O REI)
"Tal como o lírio entre outras plantas espinhosas,
assim é minha companheira entre outras filhas.”
(A MOÇA)
“Qual macieira entre árvores silvestres,
Assim é meu querido entre outros filhos.
Apaixonadamente, eu desejei
a sua sombra, e ali, eu me sentei.
Seu fruto é doce pra meu paladar.
Ele me introduziu no interior
da sala do banquete e o seu amor
era o estandarte a me homenagear.
Revigorai-me com bolos de passas!
Oh! Sustentai-me com maçãs e maças!
Pois, desfaleço já de tanto amar!
Com sua esquerda, ele me afaga o rosto,
e sua mão direita – ela me abraça.
Ouvi-me, ó filhas de Jerusalém!
Pois, eu vos fiz jurar pelas gazelas,
pelas gazelas fêmeas, e também
pelas corças do campo, e peço, enfim,
que não estimuleis tão cedo em mim
o amor, sem que ele esteja então disposto!
“O som do meu querido! Eis que chegando
ele por certo está! Vem escalando
os morros, vem saltando sobre os montes,
Parece uma gazela o meu amado,
e se assemelha à cria dos veados,
quando desponta o rosto no horizonte.
Eis que este está de pé, atrás de um muro;
e a me espreitar, às frestas das janelas,
por entre as grades, ele me procura.
Foi quando o meu querido, até que enfim,
Dispôs-se a responder e disse a mim:"
(O REI)
"Ergue-te, companheira minha, minha bela,
e vem, pois eis que o próprio inverno já passou!
Eis que a estação chuvosa enfim já terminou.
Já estão crescendo as flores; quanto aos passarinhos,
Gorjeiam já, voltaram todos de seus ninhos,
e a própria rola, enfim, arrulha o canto dela.
Quanto à figueira, a cor madura já alcançou
para os seus figos temporãos; quanto às videiras,
Tornaram-se fragrantes, pois já estão em flor.
Levanta-te, ó querida, ó companheira, ó bela,
Oh vem qual pomba a seus retiros no rochedo
mostra-me a tua forma oculta em teu segredo.
Deixa-me ouvir a tua voz tão agradável!
a tua forma é linda... (ó, vinde, por favor,
Cuidai que raposinhas, indomesticáveis,
Não estraguem vinhedos, que já estão em flor!
(A MOÇA)
O meu querido é meu, e dele eu sou.
E é entre lírios que ele pastoreia.
Ó, volta-te, querido, ó, já clareia
A luz do dia e a aragem te chamou.
As sombras, com a luz, fugindo estão.
Volta-te, qual gazela que retorna
à cria dos veados, que a esperam
Por sobre os montes de separação.
CAPÍTULO III
(A MOÇA)
"Na minha cama, eu tenho procurado,
durante as noites, com meu coração,
aquele a quem minha alma tem amado.
Eu o tenho procurado, mas em vão.
Deixa-me levantar-me, por favor,
para fazer a ronda da cidade;
procurarei nas ruas, praças públicas,
aquele a quem a minha alma tem amado.
Eu o procurei, e ainda não o achei.
Acharam-me os vigias que faziam
a ronda da cidade, e eu perguntei:
‘Vistes quem a minh' alma tem amado?’
Assim que passei deles adiante,
achei a quem minha alma tem amado.
Eu o segurei, não o larguei, e entrante
o fiz à casa onde eu tenho morado,
com minha mãe, e ao quarto interior
daquela que de mim engravidou.
Ouvi-me, ó filhas de Jerusalém!
Eis que eu vos fiz jurar solenemente
Pelas gazelas fêmeas e também
Pelas corças do campo, tão somente
que não tenteis - eis que eu vos fiz jurar -
nem despertar em mim nem incitar
amor, até que [este] disposto esteja.