O GRITO DO SILÊNCIO
Quero crer que,
não tendo encontrado
um único vestígio
que seja
de que há mesmo
qualquer coisa
do outro lado,
ser talvez
este silêncio
um índicio,
que sinto
pelas costas,
como friagem -
atravessando
os ossos
e
batendo em braile
nas vértebras
tortas
e descrentes.
Condenado está
o humano
a pertencer ao perene
para sempre?
Parece tolice,
no mínimo desperdício,
tanto para nada,
enquanto tão pouco
quanto um quasar
dura tanto
e nem acabar
acaba,
apenas se transforma.
Virar osso
e depois pó,
não pode ser
o objeto da alma,
embora
também não seja
lá essas coisas,
aceitar a carne
como invólucro
e a vida ser leve
como gás,
e, como gás,
inflável,
inflamável,
mas não injetável
em um novo
e mais adequado
pacote.
Sonho
com a reversão
da metástase
para que
seja doado ao bruxo
o poder incorporador,
capaz de dar
forma
aos gritos
que pressinto
escondidos
nas entrelinhas
do silêncio,
onde o caos
tenta,
mas não deve,
dominar ...
Quem escreve
pelo poeta
às vezes
é a sombra,
mas pode muito bem
a inteligência
usá-la apenas
como contorno.