Sobre O Quarentedois

Ele está em todas as partes

Mas não é testemunha de nada.

Não se pode adorá-lo como a uma onisciência qualquer

Ele é melindroso demais

Requere o senso de saúde mais apurado

É o saborear do vinho e do queijo

É o hábito de nos excitarmos e deprimirmos assim ou assado usando da vera ausência de fronteiras tão bem trabalhada pela natureza -

Não é pouco ter bom gosto.

É ter de se entender mera massa salivante

Oxalá saltitante

Ter de se vestir de sonho de padaria e de braseiro pra carneiro na sálvia

É o constante autodigerir-se

É este quase esquecido rosto

Por detrás destoutro rosto

É provar com prazer da própria saliva

Consumir-se a si mesmo como à mais farta ceia

Pois que não somos senão esta refeição

Libidos e egos cozidos fritos requentados

Com bastante farinha e pimenta

Que este Brasil é pátria piniquenta.

O monstro segue rolando.

Mil trombetas de gáitas e sanfonins

Mil escolas de ziriguidum

Toda prece disfarçada

Toda criação benlograda

Nos espavorindo

Espavoneando leques de luz e magia

Num caleidoscópio de zilhões de espelhinhos

O foco espetacular de nossas atenções.

E aliás atenções por favor!

Destensionar por favor!

Atenção infinita agora vâmo lá!

Eia Brasil devorador de gente eia monstro indomável!

Nasceu tão descabido tão maufalado

E como um dragão ciberdélico vejo-te abanar o rabo como um Cérbero pacificado

Sóbrio e dócil

Vejo teu coração

Magnetismo pulsando as intranets de nossos empreguinhos

E toda arte virtualizada que corre em tuas veias

O sangue e o esporro que nutrem teu mercado -

Afunilas as almas numa torrente de doença

Mas isto é tudo que tenho de que lhe criticar

Poderia mesmo dizer

Fraco do homem

Fraca da terra

Por não suportar nossa inteligência

Por ser pequena demais

Insuficiente

Incapacitada de existir em status quo cósmico quântico e outros mais

Fraco de mim

Por me amedrontar com a mutação inevitável que tal atmosfera me impõe

Fraco de mim por não encarar de frente esta ânsia iconoclasta

Que me impele à estrada

Ao subjugo dos compromissos burrocráticos -

Bem pois bem

Está feito

Ao menos posso desvendar meu cinismo

Já não sei mais cumprir ordens

Por isso tenho de ordenar-me a mim mesmo

Ordenhar-me a mim mesmo

Com patas de leão.

E fica então demonstrado O Grande Quarentedois como um vórtex digressivo voraz dilacerando toda falta de significado

Inundando cada nanométrica ranhura do Existir com a noção tão simples de que tudo seja perfeito

Esta lucidez opressora de sentidos e instintos

Os pés no chão.