O Eterno Deserto de Mim


Perdido no deserto,
esgotado em forças,
entre a espada e o punhal.
Em busca da voz da consciência
e o silêncio nada diz,
apenas o corpo acusa a profunda exaustão.
O espírito curva-se, não aos adversários,
mas ao temor de ter perdido o próprio ideal,
ao medo de ter perdido o afeto do Divino.
Esgotado em forças,
sente a aproximação da batalha final.
E como enfrentá-la sem forças?
Após tantos séculos,
até mesmo um velho leão
haverá de ter o destino do cordeiro ?
Não lamenta por si.
Não há o que lamentar.
A alma nascida na guerra
teme mais a eternidade
do que a própria morte.
Sei somente que está repleto de dor,
quer evitá-la a todo custo
e isto o faz escravo do homem.
O espírito esconde-se atrás do corpo,
tem vergonha da covardia,
mas a coragem virou sinônimo de dor.
Dor que nasce no corpo
e depois parece impregnar a alma.
Não há uma explicação plausível,
apenas uma enorme solidão,
um sentimento de eterno degredado.
Um desejo de sorrir ao Criador
e clamar por sua piedade absoluta,
num ato de desistência,
numa derrota que já nada custa,
numa vitória que já nada vale.
Não é a tristeza que dói,
mas a inexorável perda da esperança,
da crença no impossível.
O velho matou o menino.
Talvez esteja farto de tanto buscá-lo,
talvez não tenha tido outra opção
e isto o irrita tanto
quando sabe ser necessário
o dever, o eterno dever,
a dívida impagável, a sigilosa culpa,
carrasca que se fez companheira,
a tortura invisível.
Perdido no deserto,
um deserto que vai em si,
um deserto que um dia almejou ser jardim,
mas as flores não brotaram.
Os frutos preferiam outros lugares.
Não é piedade de si, mas profundo desgosto.
O punhal venceu a espada,
penetrou o coração.
Fonte de si, fonte da vida,
da vida que se perde,
como que a areia fina
que vai entre dedos.
Nem olhos, nem ouvidos.
E a boca está vazia de palavras.
Por dias melhores,
pela oração que não sabe,
pelo destino que não quis.
Por todo o esgotamento da luta.
Tudo convertido numa única e última esperança:
a da almejada paz.


Abaixo link de áudio da poetisa Rosany Costa que presenteou-me com sua interpretação:
http://www.rosanycosta.com.br/amigos/292-o-eterno-deserto-de-mim.html

 
Gilberto Brandão Marcon
Enviado por Gilberto Brandão Marcon em 07/02/2010
Reeditado em 13/04/2018
Código do texto: T2074051
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