Dê-me tuas mãos

Esse teu sorriso escamoteador de tristezas, apenas entrevisto na distância, deixa-me ainda mais faminto do nosso náufrago abraçar.

Fico a procurar com a minha nublada visão, toldada por arquetípicas mágoas, um horizonte mais firme prá que possamos caminhar.

Abdico de prantear aos céus por desventuras só minhas, visto que é tempo de forças juntar; de erguer a cabeça e as vicissitudes enfrentar.

Quem aspira vivenciar as delícias de um esperado sonho, deve estar preparado para as dores amargas que vem, costumeiramente, um pesadelo povoar.

Nada vem de graça em nossas vidas. Aquilo que hoje temos, minha querida, seja bom ou mesmo ruim, é fruto de tudo o que antes plantamos e fizemos: não há muito o que contestar.

É preciso cuidar bem melhor do lavorar de agora, viver um dia de cada vez, dado que último ele poderá vir a ser.

É temerário fazer previsões de futuro, se de certo só temos o momento presente, no qual, passo a passo, lentamente, construímos o ninho em que queremos viver.

A crença num Amanhã melhor nos fortalece no Hoje, abrindo perspectivas onde só havia muros de intransponível aparência.

Pavimentando a estrada que juntos sonhamos percorrer, estão árvores seculares, testemunhando, incrédulas, a graça de tua presença,

Misto de ousadia e inocência, de contenção e impaciência, fornecendo à tarde invernal o cheiro bom a exalar de teu corpo, cheiro que guardei comigo como a mais preciosa essência.

Quero ainda poder, meu amor, ensinar-te, e também aprender, a dominar o medo que vida nos dá, a buscar proteção naquele abraço só nosso, refúgio seguro contra qualquer turbulência.

Lembro-me que há muitos anos li um texto intitulado “As mãos de Eurídice” de Pedro Bloch. Um monólogo impressionante de um homem buscando refúgio no convívio com uma jovem mulher.

Mãos curam e ferem; aproximam e afastam. Mãos de amante são quentes, macias; mãos de madrasta, agridem, são frias.

As mãos da minha amada formam par inseparável com sua voz: são doces como compota de pêssego servida na cama, com a calda a escorrer pelo canto da boca.

Vale do Paraíba, manhã do último Sábado de Junho de 2009

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 18/10/2009
Reeditado em 18/10/2009
Código do texto: T1872636
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