Fio de Prata

É uma sensação bem estranha, ver o meu ego, este cavalo outrora selvagem, agora posto em peias – dominado.

Lembra-me um carneiro pintado, daqueles adestrados, com os quais tirávamos retrato ao lado; um bichinho inerme – coitado.

Humanos que somos, aqui encarnados, precisamos, também, de sangue correndo; de coração batendo firme - acelerado.

Então ouso libertar o meu ego de suas peias, tomo do fogo da paixão diretamente nas veias – provo do gosto de estar apaixonado.

Entre meus dedos prendo um fio de prata que teima em fugir de minha cabeça; insistente – rebelde insolente.

Creio que tenta mostrar-me, desajeitadamente, que a razão deve preponderar sobre a emoção.

Pouco sabe de Vida este rebelde fio de prata. Escondeu-se em impenetrável mata, a tentar poupar de loucuras o meu coração.

E hoje, pejado em anos, de migalhas experiente, diz do alto de seu viver obtuso: “-não fique confuso; amar é coisa de demente“.

Ouço frases retumbantes, proferidas como um fumante a espalhar no ar seu fumo transformado em esparsas volutas.

Penso que quem as constrói, é como um juntador de mariscos na areia, recolhendo preguiçosamente o que o mar lhe oferece em catadupa.

Para que extrair qualidade deste nosso viver? Sendo que é bem mais fácil na proteção da mediocridade se esconder?

“-Botar a cara na janela? Deixo isto para os loucos”. Esta é a postura dominante desses que levam vida escusa de farsantes.

Dentro de si, sabem que pouco acrescentam à Vida. Lembram-me os hipócritas de Bizâncio – a fingir-se de importantes.

Mourejam a repetir truísmos. Pulam alegremente de Shakespeare a Cícero no maior cinismo - de maneira acachapante.

Diante de tanto casuísmo, profiro a atualíssima e sentida frase de Hamlet: Eis a questão: ser ou não Ser?

Há vida pulsando lá fora. E também há, aqui dentro deste meu irrequieto peito, muita paixão por esta vida que pulsa, recheada de alegrias e tristezas; mas sempre a se renovar daquilo que aparentemente fenece.

Vale do Paraíba, manhã da primeira Terça-Feira de Março de 2009

João Bosco (Aprendiz de poeta)

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 06/10/2009
Reeditado em 06/06/2011
Código do texto: T1850558
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