me eu
singularidade ostensiva
a vontade de ter reunida
mais de uma vontade na vida
saiu sem sentir a partida
fugiu com a aurora esquecida
chutou o boné pela estrada
comeu a comida esquentada
a mão não queimava a marmita
pensou no que tudo que habita
o lado esquerdo do peito
notou que havia um defeito
no corte da sua camisa
e que era viril e incisa
a cicatriz contraída
na cara cansada e marcada
por tanta saudade e conforto
adquiridos no porto
da ilusão consumida
lá embaixo passou a barata
vestida de freira e de fato
havia no concubinato
a exatidão do crepúsculo
as patas do gafanhoto
pintavam de verde o chão
no colo do ancião
o velho e o mal se confundem
a graça da borboleta
pintada de ocre e de anil
foi tudo o que ele não viu
pois não quis entrar no museu
me chama, me bate, me eu
me engano como o filisteu
perdeu o artístico dote
ralou e se foi num pinote
mas eu me imiscuo, me chamo
me arguo e até me reclamo
me invado de um corpo infeliz
me calo como a meretriz
que dá sob a condição
de nunca perder a emoção
de assoar o nariz
Rio, 23/06/2006