NÃO CUIDEI DO SILÊNCIO

Hoje, não tive tempo de escovar a alma

com as cerdas da atenção, do carinho e da observação.

Fui precipitado em quase tudo o que fiz.

Não ouvi o canto do pássaro e nem toquei o orvalho

prateando o dorso da relva pela manhã.

Os raios de sol infiltrados entre a ramagem das árvores

não foram notados por mim.

Os beija-flores tornaram-se invisíveis,

e as borboletas se ocultaram, misteriosas.

As fragrâncias do dia e da tarde,

o doce aroma de romã e jasmim

passaram incólumes por mim.

As aranhas teceram segredos em fios de luz,

imperceptíveis aos meus olhos cegos.

O zênite e o cair da tarde

escoaram-se nas areias do esquecimento.

Não cuidei do silêncio

que germina as pequenas flores azuis

da quietude no pensamento.

Agora, nesse momento mágico de estrelas de prata,

meus sentidos aguçados penetram a alma da noite

em percepções de ouro e diamante.

Como fui tolo por todo o dia em meu sono de olhos abertos!

Mas a noite chegou.

Sinto-me vivo em cada poro.

Com ouvidos atentos percebo a canção dos grilos.

E no brilho intenso do vôo breve do vaga-lume,

decifro o mistério do universo.

José de Castro
Enviado por José de Castro em 16/06/2006
Código do texto: T176799
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