Ao meu filho ainda célula
Lhe peço, meu filho, não nasça!
Que a vida aqui fora é um troço sem graça
O mundo é, no fundo, uma bola quadrada
Uma bola que rola parada
É um quarto cheio de gente doente
Um barco revolto, solto à corrente
É, em suma, um planeta e mais nada
Você, que é ainda somente semente
Fique aí no seu canto. Não brote!
Se mantenha no escuro
No sublime silêncio do abismo entre as eras
Fique aí no seu ninho
Com sua vida suprema
Longe da mesquinhez
E livre das dores e dos sonhos humanos
Durma, sem paz ou tormento
Sem desejo ou desilusão
Durma apenas
Neste perpétuo sono primitivo
Que eu de ti tanto invejo, meu filho.