DO LADO DE LÁ DO INFERNO
É quando eu preciso parar que o mundo rasteja absorto na própria contra vontade.
É quando eu penso em solicitar o dossiê de todas as odisséias que um par de brilhantes me sussurra antipático.
É quando eu qualifico todos os adjetivos que um senhor de mau humor despeja do céu o problema maior.
Pergunto por que não há mais perguntas. Cavalgo num timbre de cinco patas, cintilo como o pó daquela vidraça, e vivo como morre a traça: vilão do intelecto, sorrindo por bem feita desgraça.
São apenas dois passos, há apenas um caminho. São apenas dois goles, há apenas uma voz. São apenas duas presenças, há apenas metade do mar. São apenas dois corpos, há apenas uma cor de sangue. São apenas duas portas, existem milhares de olhos na escuridão.
O lado de lá do inferno, a proximidade do azul. O que não sustenta cresce incessante, o que não veste seduz os invisíveis, o que não mergulha subtrai em laudas desertas, o que não inflama prega a tensão do gelo, o que não rosna grita uníssono na metamorfose, o que não acontece a mente purifica... E todos continuam do lado de lá... Do inferno.
Ao que já assistiu o pior do fim não comove um gênesis em aurora. Ao que ainda sobrevive sano uma caverna é qualquer oásis, uma bondade é manter-se longe, uma verdade é ocultar mentiras, uma injustiça é oferecer auxílio, uma ameaça é brindar com sorrisos. Pra quem está do lado de lá, o mínimo movimento é o piso, o mínimo silêncio é juízo, a mínima paisagem é paraíso.
Douglas Tedesco, 14 de junho de 2009.