AMPULHETA À PILHA
Ontem eu esperava por hoje.
Estou aqui.
Não me sinto diferente por descobrir
Que não há nenhum hoje e nunca haverá.
Só há o ontem por me lembrar dele,
Só haverá o amanhã porque
Anteontem hoje era o futuro.
Ficar trancado dentro de um relógio
Pode fazer com que você entenda o mecanismo,
Mas não vai fazer descobrir como funciona o tempo,
O instante do nascimento das primeiras cordas,
O relógio do nascimento,
O berço das horas,
Como é que se balança
E se move as primeiras hordas...
Talvez até encontre o cofre onde Ele guarda
Todos os ontens de sua vida,
Qual o verdadeiro ontem de hoje,
No tempo que não haverá amanhã.
Toda vez que ali chegar
Estará praticando a ausência do agora,
Inpresença de motivos para se comemorar
Qualquer data que se possa pensar,
Datas são números desenhados nos úmeros
Dos centauros que passeiam pelo espaço
Ausente de gravidade pois onde não há sarilho
Não há balde.
Como se vê, o que escrevo agora é irrelevante,
Não há um saco de tempo guardando nossos instantes,
Apenas estar aqui é que é constante,
Ou então quando estiver passeando pelas redondezas
Descubra quanto tempo passou até ter certeza
De que seu relógio parou de funcionar,
Se pôs ausente de movimentos, pôs-se a sonhar;
Nesse momento, lá dentro, perceberá
Que já não mais valem os juízos de valores;
Que andará pelos corredores do shopping
À procura de uma loja que te venda,
Com alegria, uma ínfima peça, uma pequena bateria,
E, sorridente ao vendedor, comprará como se fosse remos,
De novo descerá a corredeira do tempo que havia parado
Dentro do teu relógio que aguarda a corda bastarda
Que moverá teus dias, teus ontens, amanhãs,
Teu hoje que nada mais é do que o tempo palavra,
Caiaque cor mostarda, a navegar o rio de Tudo
Em busca da nascente do Nada.
Preto Moreno