existir sem viver
Se as flores não lhe falarem da primavera
Se os sinos das igrejas não lhe falarem de fé
Se os olhares das crianças não lhe falarem da pureza
Não importa, você está cego
Não importa, você está surdo
Imerso numa indiferença
brutal e absoluta
E, o absurdo do tempo
Nos faz o paradoxo de nós mesmos
Nos faz o côncavo e convexo
Sem eixos
Sem imagens e reflexo.
Seremos sombra antes do advento da luz
Seremos a falta antes do ser
A essência enjaulada em corpo inútil.
Ainda que cortar os pulsos não signifique
nada ou muito pouco...
uma tentativa de autoflagelação ou suicídio.
Há um breve interregno
a aguardar o silêncio das flores
por sobre o ataúde
A ansiar pelos sinos das capelas
a chamar fiéis ou lembrar aos infiéis
de sua solidão crédula
Ou a catar nos olhares-menino
a pureza desafiadora do poder,
dos pactos,
dos silentes compromissados
com o poder ou com a servidão
e a sobrevivência radioativa.
Se as flores não lhe revelarem a primavera
E, nem o céu o infinito.
Estás diante da lápide fria
de um existir sem viver.