Fogo Cigano
Brumas noturnas esvoaçantes caídas e soturnas
Sobre um mar que sussurra e delira pelas escunas
Encantos que dissipam lamentos, choros e prantos
Ofegando nosso corpo com deliciosas carícias
De uma brisa que alisa e enfeitiça sem malícias
Abrasando a nossa alma que baila e se encanta
Ao som das guitarras que assanham as entranhas
Sim!... Que bela noite cigana que nutre e canta
Melodia flamenca como chama de fogo insano
Ouça o grito que é o hino da nossa herança
Força sobrenatural que pulsa na pujança
Na emoção mais dilacerante de uma paixão intensa
Que nossos pés descalços dançam sob as brasas
Expostas na areia do tempo em suave tentação
De um ritmo que nos consome sem inibição
Tudo implora, persegue, chora e aflora
Acorrenta e alimenta as mais livres ousadias
Como as ondas da sedução movendo-se
Seus olhos escuros, profundos e sem pudor
Acompanhando teus cabelos negros ao vento
Declamam os segredos mais velados e inconfessados
Contemplando os teus mistérios que a fazem eterna
Onde tanto quero, amo, desejo, anseio e venero
Sinto pulsar nas minhas veias ciganas o frenesi
Dos delírios que a música parece jorrar do sangue
Que escorre feito cascata que lava nosso espírito
E nos conclama ao furor de um amor alucinado
Assim nos vejo navegando e dançando entre véus
Numa cadência estonteante que fulgura beleza pura
Em dois corações entrelaçados e ritmados de ternuras
Com as mãos cadenciadas ao toque delicado de brandura
Onde as carícias atenuaram as dores mais sentidas
No mais íntimo dos nossos seres tudo aqui se festeja
Pela certeza de que a natureza e sua mais sutil realeza
Uniram da diáspora, das guerras, tempestades, trovoadas
Nossas almas eternas, ciganas, guerreiras, entoadas
Na sinfonia onde os corações náufragos aportaram
De uma jornada onde ressurgiram entre os feridos
De um desejo arrebatador que fulgura como brilho
Cigano poderoso e libertador de um amor talhado...
Abençoado, domado, cúmplice dos deuses do fogo,
Da terra, do mar, do ar, testemunhas do amor eterno.
Hildebrando Menezes
Nota: Poema inspirado em ‘Encanto Cigano’ da Salomé
http://www.recantodasletras.com.br/poesias/1264383