Dança da chuva
E choveu...
e choveu...
Durante longos meses choveu e choveu.
Rios e mares encontraram-se num só curso.
E inundaram, e destruíram, e tudo invadiram.
E povos inteiros pereceram.
Mãos para os céus rogaram preces.
Profetas diziam que tudo estava escrito, e agarrados às suas profecias, submergiam.
Boatos corriam que crianças com nadadeiras nasciam, e que ricaços em transatlânticos partiam... para onde iriam?
E choveu...
e choveu...
E, quem sobreviveu... com a intempérie aprendeu!
E reprojetaram, e reinventaram, e reciclaram, e tudo reconstruíram.
E da água comeram, da água beberam.
E, quem diria? A água já não mais temiam.
Até que... um dia...
A chuva cessou...
E o sol novamente brilhou...
E as águas retrocederam...
E rios e mares aos seus cursos verteram...
Profetas emergiam bradando “eu já sabia!”, e bisonhamente sorriam...
Boatos corriam que das crianças as nadadeiras caíam.... e que transatlânticos de luxo numa floresta jaziam.
E o sol brilhou e brilhou...
E as casas voltaram a ser casas, as ruas voltaram a ser ruas, os povoados voltaram a ser povoados
Barcos, obsoletos, dos telhados foram retirados
E o sol brilhou e brilhou por longos meses...
Brilhou, brilhou...
E o rio secou
A colheita não vingou
E a fome imperou...
Mãos para os céus rogaram preces
De onde tirar sustento, aplacar a sede?
E povos inteiros pereceram
E, nas noites quentes da única estação que restou
Ouviam-se o chacoalhar de corpos suados
Ao tenso ritmo da dança da chuva...