A chuva

A chuva desfaz a pintura,

Do guache que cobre a rachadura,

Mal escondida está a cicatriz,

De uma dor curada por um triz,

Na parede das lamentações,

Grafitada ao som de samba canções,

Mural de trajetórias invisíveis,

A chuva faz chorar os insensiveis,

Com sua armadura prateada,

Do reino de Camelot com sua espada,

Rasga a barreira que protegia a alma,

A história não contada apaga a chama,

Molhando as páginas resistentes,

De esperanças incontestes,

Na ansiedade de amigos distantes,

Em um brinde pelas ruas cintilantes,

Sabendo que nada mais será o mesmo,

Conversando sobre o que vai a ermo,

A chuva alaga as vias do córrego,

Derrubando as pontes do superego,

Das análises desencontradas,

Nas feições mascaradas,

Que se repelem no antagonismo,

De um suspeito masoquismo,

Que atiça as dores não confessadas,

Fábulas de belezas encantadas,

Encasteladas sem acesso,

Buscando romper esse processo,

Em linhas telefônicas de ontem,

No Wi-Fi do longo hoje como totem,

Do universo quântico está no amanhã,

Dizemos adeus ao labirinto de lã,

Assim nosso veleiro ruma no mar,

Esqueça que estivemos aqui,

Na arqueologia do sambaqui,

Apenas deixe o vento da chuva nos levar...