um amor singular

se queres saber quem sou,

dou-te uma trégua.

faço-te votos de perdas profundas,

e por entre abismos abissais,

sucumbirás à insuficiência.

 

perder-te-ás em corredores,

profundidades obscuras,

vãos obsoletos e intrusivas vias,

sem nenhuma mostra,

nem chispa, nem vela.

 

se queres caminhar em mim

terás que descalçar teus pés

sabendo-te que os perderá em acúleos,

tão cruéis e rebeldes a sangrar

em chagas, e transmutar em veios.

 

sou solo siltoso, e só tuas lágrimas

mover-me-ão em duas massas,

uma que amassarás com os pés,

outra na qual cuspirás amargo

e não haverá nada que me faça fértil.

 

se de mim desejas extrair o sumo

saibas que sou veneno raro

que te matará tão logo inales,

e ao teu toque, cairão por terra,

todos os teus dedos.

 

se ainda assim me queres perto

se ainda pensas poder tornar-me algo

dileto, terno, ainda que oblíquo,

saibas que nada prometo a ti,

nem pretendo expurgar pecados.

 

mas se acima de tudo

sou solo penetrável a algum germe,

que seja o teu apodrecido gosto

ou tua estéril matéria,

a rasgar-me com potência de garras.

 

seremos o encontro do estapafúrdio

do imoral e do perverso,

seremos qual cicuta a este mundo

de frágeis e débeis.

e nada mais restará deles, ou de nós.