Oitavo conto poético: um portal
Eu consegui, enquanto sonhava
Voltar no tempo, sem saber onde chegara
Apenas deu para chutar o ano:
1996??
Não sei
Só sei que estava na mesma casa
Um pouco diferente
Móveis que não existem mais
A sala já não é a mesma
Então, eu me escutara
Gaguejando um pouco
O mesmo fluxo de pensamentos, correntes, como um rio caudaloso
E eu notei que não foi tudo que mudou
Porque continuava a ser quem eu sempre fui
Menor, mais franzino
Cabelo cortado
Olhar de menino
Sombra de um mundo imenso
Mas sempre um sonhador
Um pensador incontrolável
E me vi ligando a televisão, sentando na frente dela, com uma taça de leite condensado e Nescau misturados
Me vi como eu nunca havia me visto antes
Bem diferente do que me olhar no espelho ou pela janela
O feitiço que benzeu o meu sangue
Se já estava enfeitiçado pelo reflexo do meu brio
Desde o começo
Já tão distante...
Como um filho pequeno
Mais um aprendiz de Narciso
E pensei em tudo o que ele ainda iria passar
Quanta coisa!!
Pensei em falar dentro de sua consciência
Em lhe dar uns conselhos
Mas fiquei vacilante de me aproximar
Não sei se alteraria o seu caminho
Se mudaria quem ele e eu somos
Se poderia ser muito pior
Foi porque eu esqueci que estava sonhando
Que nada daquilo era verdadeiro
Apesar de ter sido um sonho tão real
Mais que um breve delírio
Se parecia um mágico portal
De tudo aquilo que eu não acredito
Tal como na vida imortal
E eu abri os meus olhos
Senti que estava vivo
Do lado, o ventilador ligado
Minha gata de uns quase 80 anos
Humanos
Dormindo
2024
E claro, pensando na vida e no nosso pacto