TESTEMUNHA, O BEIJA-FLOR
O Beija-flor beijou com tanto amor a flor do seu amor, que sonhou que amou outro amor num dia acinzentado e noite sombria, e deitou e dormiu despojado de toda a agonia, venham, vejam e ouçam o que diz o vigia! Há prantos na Terra por sangue derramado! Há soluços, gritos, ranger de dentes por todos os lados. E ele nem um pouco assombrado, pois sabe que a vida leva a morte lado a lado. Mas quando chegares ao frio do calabouço e teres a alma suspensa, e a prisão acolher sua carne de forma pretensa, e te restares um único suspiro por toda esperança, e lembrares que em ti imperou tamanha arrogância, e volveres no espírito por toda pujança, e quebrares as cadeias da ignorância, e saíres livre de toda penúria, e lembrares que viu e ouviu o vigia naquele dia acinzentado e na noite sombria, abrirás os teus olhos quando raiar nova alva, abraçarás forte teu amor de encontro ao peito, e não verás o Beija-flor que se foi, para não contar-te o pleito, daquele sonho resoluto, entrevero, e suspeito, deixando-te um amargo e numa sequidão de estio, outrora fostes melhor o calabouço, as suas cadeias, e o seu frio.