DELIRIUM AUGUSTI

A peste, mais e mais, vai se espalhando,

deserta quase, a rua, de viventes,

somente os mortos, tétricas caretas,

vão compondo um macabro festival.

As aves carniceiras saciadas,

crocitam seu negror pelos telhados.

O apetite necrófago das moscas

sobrevoando um corpo moribundo;

pegajosas, cinzentas e irritantes,

em zunzum, sobre as pútridas feridas,

lambem o pus que escorre na calçada.

No imundo passeio, vômitos, fezes,

os vermes fervilhando a lama escura,

um cheiro putrefato se esparrama,

e empesta o ar viscoso e envenenado.

Bactérias invisíveis se alimentam

das pústulas abertas pelo corpo.

E o poeta enlouquecido, atordoado,

tentando descrever a cena, em vão...

Os versos jazem tristes, amontoados,

e as rimas sem vontade de rimar.

(Passou a tarde toda lendo Augusto

e agora, febril, treme de susto...)

Um turbilhão no estômago convulso

e, ardente, um jato azedo a sopitar.

No jardim, borboleta em alvoroço,

sobre a flor sedosa e colorida!

Indiferente ao desgraçado moço,

que buscou famélico a comida

mas agora, vomita o seu almoço.

Fernando Antônio Belino
Enviado por Fernando Antônio Belino em 07/01/2022
Código do texto: T7424261
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