EU E O URUBU
Sentado ao sol morno duma manhã outonal
Sentindo na pele a aragem ordinária a estes dias
Imagino-me a planar próximo à celestial moradia
Ponho-me a confabular com um urubu.
Num poético e filosófico devanear, digo-lhe:
Amigo, queria ser como tu…
Ainda que próximo ele não me entenderia
Quiçá na imensidão celestial bailando suavemente
Levado pelas correntes circulares de ar quente
Me enxergaria, me ouviria, mas me entender não poderia
porém, eu continuo com meu diálogo surreal:
Já me compararam a ti, irmão, vestido de Fraque
E ao contemplá-lo nas imensas alturas
considero-te um destemido e percebo sim,
O quanto somos parecidos
Eu, pelo pensamento e posicionamento invertido
Tu, por ser ave de pobre nobreza
“Criados,” um para ser criado e outro enxotado pelo desdém
Apesar de limpar a sujeira que incomoda a realeza.
E tu ainda limpas as da plebe, também!
Valorosa ave de pobre nobreza!
Queria ser como tu, mas sei que não vou
Posto que também voo, quando me elevo numa prece,
Ouvindo o Pop de Collins ou de Baker, o Soul
Ou degustando um Merlot que suavemente me entorpece
Queria ser como tu e isto é intrigante
Não te invejo, apenas admiro
Pois ser quem sou e tentar melhorar a cada instante
É o que eu ainda prefiro.