JUDAS, O PROSCRITO

“- E vós todos, porém, sabei toda a verdade

Um de entre vós me há-de entregar nesta Cidade.

De novo se puseram todos a gritar:

- Quem, Senhor… quem, Senhor, vos irá entregar?

- A quem eu der mais uma taça, esse será.

- Faz o que te compete, ó Judas, p´ la manhã!

Judas fitou o Mestre, bebeu… e saiu

E a partir dessa hora ninguém mais o viu.”

………………….

Naquela madrugada, fatídica e trágica,

O Iscariote cumpriu a sua vil traição:

Entregou o Rabi, por uma quantia mágica,

Na mão dos Fariseus, felizes até mais não…

O seu primeiro gesto foi risada infernal.

Limpando os lábios do negro beijo que dera,

Correu em desespero p´ lo denso matagal

Co´ a bolsa do fel à cintura, feito quimera.

Raiava já o sol daquela triste manhã,

Judas, estremunhado, saiu do seu albergue

E, sem deixar de beber o seu habitual maná,

Inspeccionou se a quantia fora bem entregue…

- Maldição… maldição! Faltam-me três moedas:

O acordado na jura foi de trinta dinheiros!...

- Ah, vou já ao Sinédrio… nem que seja-às-cegas

Reclamarei o que falta àqueles pantomineiros!

- Dai-me já o que é meu. Foi assim que me juraste!

- Ai foi? Olha o engraçadinho a exigir-nos a comissão,

Não querias mais nada!... Não viste que te enganaste?

- Ah, desalmados! Soltai já o homem da prisão!

- Ah … ah… ah… ah… ah… gargalhada se ouviu

E o pobre Judas em fúria atirou todo o dinheiro

Pro pátio do Sinédrio e, saindo dali, se sumiu

Rondando p´ la cidade quase o dia inteiro…

Iscariote, sabendo o que se passara no Calvário,

Não esperou mais e foi-se enforcar numa figueira.

E assim, de forma trágica, aquele solitário

Pôs fim a uma vida triste e vinagreira.

Enquanto tal, no Gólgota, uma Cruz ditou

Um fim de Vida abnegada, mas com brilho…

E ali, num ermo, o vil Destino proclamou:

- Mais lhe valera a ele nunca ter nascido!

Mal o dia acabara de raiar… era Sábado,

Ocasionais viandantes por ali passaram

E, à vista daquele espectáculo tão abjecto,

Desceram-no… e, para o monturo, o arrastaram.

Não lhe querendo pôr as mãos, porque eram puros –

E, na Purificação, tudo lhes estava interdito –

Aqueles estranhos homens de corações duros

Abandonaram, na lixeira, Judas, o Proscrito!

Frassino Machado

In VIA CRUCIS

FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 08/04/2020
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