Ponto cego
Sei das tuas noites de insônia
Conheço os goles de água
Que tua boca sedenta
Bebe como se estivesse
Saboreando minha saliva
Conheço teus suores noturnos
Teus banhos gelados
Esse olhar perdido na escuridão
Sei dos passos no quarto
Nas mãos passadas pelo cabelo
Ou mesmo acariciando os versos
Os poemas que te fiz estão aí
Falando por mim, gritando por nós
Sei também do abismo que temos
Da distância aveludada do tempo
Da época errada em que nascemos
Em que fomos um do outro
Sei das horas de fuga, dos voos
Das estradas absurdas que percorremos
Dos perigos sabidos, confessados
Sei do barulho da brisa que te beija
Das gotas de água no teu corpo
Dos gritos contidos na tua garganta
E da vontade absurda de estar aqui
Sei dos abraços perdidos no ar
Imagino o vinho tinto descendo
E o sabor vermelho do beijo não dado
As mãos trêmulas segurando a taça vazia
Sabíamos que chegava a hora
Quem saiu primeiro?
Quem olhou para trás?
Quem embarcou mais rápido?
Quem pegou o primeiro trem?
Não saberemos nunca
Nos perdemos assim...
Pegamos voos diferentes
Em diferentes portais
Atravessamos em diferentes turnos
E agora sei que foi necessário
Entendi que tenho que seguir
Perdão por não insistir, desistir
A partida foi a solução
Quem sabe um dia
O mesmo destino
Pregará a mesma peça
Aquela em que te encontrei
Naquele capítulo que inventamos
No parágrafo em que ficamos
Você sabe onde estou
Para chegar aqui existe trem
Avião, carro, navio....
Só falta encontrar o portal
E, este só aparece, quando estamos
Prontos.