CONCHA
Sou pérola
mascarada
pétrea, brilhante, pura
esculpida do manto da concha
em esmeras camadas concêntricas
nua, sem rumo, apenas um ser prematuro
poema em concepção
com a face fragmentada
disfarça as feridas
volúvel, volátil
insaciável, intransítivel
profana, musa, poeta
eloquente amante
das letras
dentro da minha dor
teço as tramas da
poesia
entranhadas
nas curvas, valvas,
voltas que a vida
dá
refaço-me dos corpos estranhos
que me apunhalam,
apavoram,
desalinham meu destino
sob os escombros,
brilhante por fora
por dentro ela é
chama que não se cala
lábios insanos
mãos lançam a palavra
pérola lírica oculta
travessa,
nos treversos,
reversos
versa a dor
dos temores
esculpi o verso
a poesia que ecoa
que dilacera a carne
que não se contém
no peito escorre
o sabor, a dor e a força
de ser poeta
carrego em mim
a dureza da pérola
que pari das entranhas
da concha
dos pedaços aprendi
a (re)constrói-me!
volto à minha concha
das cicatrizes e males
do mundo que ousa
apagar o meu brilho
sou um poema
a boca sedenta
profana
infernal
se queseres me conhecer?
ouse se aventurar
ver se me encontra
nas linhas, ou melhor entrelinhas!
sou a língua ínfima
multifacetada,
se minhas páginas leem
delas jamais
queira sair
escravo das palavras
serás!
sou presa, predadora
entre o manto da concha
meu brilho
armadilha
linha que laça,
entrelaça
nas redes insaciáveis da poesia.
(Karol Castro)