"MEDUSA APAIXONADA"
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1
Quanto tempo faz que estou sozinha
apenas acariciando meu arco
e minhas flechas?
Sendo despertada dos meus sonhos
Nos quais ainda sou bela
na calada da noite
pelo chocalho das cobras em minha cabeça.
Sempre inquietas.
2
Certa vez um jovem surgiu
Um moço que deveria ter chegado
a vida adulta
Há pouquíssimas luas
E como ele era lindo! E como eu ria! E me escondia!
dançando pelas pilastras
do meu enorme labirinto
Atirando-lhe mimos
Flores e muito ouro
Ele sorria e gritava
"qual é o nome da minha amada?"
e tristemente eu lhe disse
Que partisse
“Por favor! ”
E me deixasse só.
3
Ele tentou com toda força e rapidez
alcançar meus passos
chegar ao meu encalço
e parar o veloz arrastar
de minha calda de serpente.
Foi então que uma águia surgiu
Posando em meu ombro
sem medo do meu feitiço
Era Zeus.
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4
Era ele, o grande e severo pai
incapaz de dar amor aos seus filhos
que são tantos de se perder
E eu fui apenas uma moça bonita
querendo minha vida viver
E a inveja da deusa
Fez de mim a monstra que sou.
5
“Concedo-lhe o amor deste homem
Rainha da feiura! ”
“Agora... vá! ”
E a águia voou e despareceu.
Tive a impressão de que
a palavra do grandessíssimo
acalmara até as minhas cobras
E ao ouvir mais uma vez
O passo rápido, indignado e insistente
Do meu amor,
desta vez...
Estanquei.
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6
Como posso descrever
tamanha tristeza...
tamanha fraqueza?
Encarei sorrindo
ao que me retribuiu o olhar
chorando
Embasbacado por tanta feiura
E ao vê-lo envolto em caretas de nojo
Minha ira despertou as cobras
e o feitiço se fez...
Meu formoso moço
Virou pedra
de um granito grosso
que derrubei com força num só golpe
afim de vê-la espatifar-se
No chão do labirinto
Se tornando quase areia
Migalhas de meu pretendente ...
E pedaços... do meu coração.