Cão
Margeando magnífico litoral
Madame e seu fofo mascote
Um cachorro, ainda filhote
Caminham, sob sol, sobre sal
Traiçoeira, onda surpreendente
Mais potente do que o normal
Reclama a Poseidon o animal
E uma criança, assim, de repente
A dona e a mãe, fazendo barulho
Desespero é criado na multidão
Que acorre, atônita, à confusão
Estimula a dona a um mergulho
Filho e filhote estão na direção
Todos gritam: “pega o menino!”
E ela, sem grilo nem desatino
Nada, resgata e salva… o cão
Suspirando, à areia regressada
Lança-se ao solo, agradecida
Pelo cachorro ter salvo a vida
E deixa toda a turba revoltada
Enquanto uns se lançam ao mar
Outros ficam com ela a discutir
“Como ao menino deixaste de ir
Preferindo, um animal, resgatar?”
Eis que o bate-boca só aumenta
Pois só gritam e brigam, tudo falam
Porém, num rompante, se calam
Quando o cachorrinho argumenta:
“Mulher, nos diga qual o teu problema?
Que preferiste resgatar a mim
Reles bicho, da existência ainda mirim
Do que vida humana, sem nem dilema?
Eis que formoso e terno eu sou feito
E minha existência tanto te alegra
Que te cegaste, endurecida megera
Arrancando a consciência de teu peito?
Graças aos Céus ainda estes reclamem
Da pura insanidade deste teu ato
Pois há quem mais ame cão e gato
Que seu semelhante, mulher e homem!
Eu bem sei que muito te entristece
A torrente de erros e maldade
Que é cometida pela humanidade
Mas mau isto também não te parece?
Mais a bichos e coisas amor devotar
Do que ao próximo, tão superior
Na ordem do tudo, criado com louvor
Da dignidade, impossível comparar?”
E, assim, aquela praia emudeceu
Perante o milagre do bicho falante
Emanando sabedoria, mui galante
Verdades disse, e lições lhes deu
Agora, amigos, digo-lhes que me vou
Após contar extraordinário relato
Mas não sem antes concluir o ato
Dizendo que o menino, alguém salvou