Asas de ouro

Que brilham mais que preto e branco

Que brilham mais que o pranto

Que enchem o céu (nublado) de sol

Que furam os olhos molhados com o seu punhal

De sua grandiosa ilusão

De sua beleza imersão

Que voa rasgando o fel

Paralisando o veneno

Misturando ao sereno

Asas que nunca cansam

Que com a morte dançam

Que fazem as pessoas levantarem de suas camas

E os mortos .. dos seus caixões

Que falam pra saudade, não fazer tanta manha

Aconselham a não ter mais paixões

Asas que vigiam a cidade lá do alto

Que vigiam todas as cidades

Que escondem e roubam todo o sol, com o seu brilho dourado

Que petrificam o olhar, com o seu chamado

Asas e os anjos saltimbancos

Que sucumbiram ao circo velho, acabado

Que trançam os cachos da trapezista

Que a viram com asas e pernas lisas

Voando pelo céu da lona

Encantando e sonhando

Com o corpo enfeitiça

A mente, que é areia movediça

Os olhos tristes pensam por si mesmos

Inventam fórmulas para o coração

Contas que não se resolvem

Pensamentos sem resolução

Asas que querem apenas um desejo

Da mais pura afirmação

Querem sentir o chão duro

Querem amar, sofrer, sonhar

Sentir o gosto do café

Querem deixar o sonho de uma morte-vida

Querem ser finitas, à alma parida

Ter corpo e a sua prisão

Querem a inconstância, ao invés de uma eterna idade

Anjos que querem ser menos do que são

Homenagem ao belíssimo filme ''Asas do Desejo'' (1987) de Wim Wenders