DENTES
Éramos 32
Na Colina Escarlate
Aguardando resgate
Entre espaços vazios
Os vizinhos sorriam
Calmaria ameaça
Apavora-nos o linguado carpete
Seus obscuros olhos ocultos
Cor de alma enlameada
Arde em frias chamas encarnadas.
O Exército Cariendio avança...
Inseparáveis guerreiros
Muitas baixas sofreram
O tempo passa sem pousar
Passa-tempo a admirar
Belos uniformes nos encobre
Claras vestes respeitáveis
Que são vestes respeitáveis?
Não sabemos
Pensar não nos interessa
Não pensamos, agimos
Temos pressa.
Atacar artilharia!
Boa pontaria!
Prossigam, rapazes!
Nosso objetivo único...
Que esquarteje carnes ensanguentadas
Que a fome por ódio domine
Que a amarga pólvora apavore
Que extermine medrosos rostos molhados
Olhos vermelhos embaçados
Soluços forçados.
Éramos trituradores natos
De repente, alvos atingidos
De repente, corpos retorcidos
Gladiadores marcados no infinito
Que horror memorável!
Espíritos mutilados
Para sempre vendados
Da luz, seres poupados
Pesar atmosférico
Gélido perfume penumbral
Repletos por rude negritude
Rubras águas lavam, paranoicas,
As sujas armaduras
Afogam-nos no Mar Vermelho
Mudas sombras gotejam...
Misteriosa, a solidão transita
Temida por todos
Sim, todos os tolos
Adorada por poucos
Sim, os grandes loucos
Áspera liberdade emprestada
Nunca mais devolvida
O ar envenena as aves
O mar asfixia os peixes
Creem-se livres
Oh, ingênuo pudor
Voo impedido
Laços rompidos
Gritos de dor
Éramos então 32
Nós, apenas nós
Na Colina Escarlate
Esperando resgate
De alguém mais feliz
Coroas destronadas
Colina derrubada
Fatal destruição
Entregues à sorte
Esperança frustrada
Decepção lançada
À beira do precipício
Jogar-se do abismo
Cair, cair, cair...
Sumir, sumir pouco a pouco
Corremos riscos ainda
De quem sabe um dia
Na luz cortante da escuridão
Nos vazios úmidos da imensidão
Contemplar altos horizontes
Além de pungentes gritos
Cansados de serem ouvidos,
Jamais atendidos...
Buscar serenos sorrisos
Onde possamos brilhar.