até quando?
disperso o meu verso
na neve, no gelo, no vento
e nos olhos da noite
desconsoláveis do sabor da vida
disperso o meu verso
nas árvores despidas de verde
secas, queimadas pela geada
e relâmpagos errantes
disperso o meu verso
nos olhos das crianças
nas primaveras esquecidas
e no luto sombrio do mar de inverno
disperso o meu verso
nos meus irmãos sem abrigo
exibindo os velhos e sujos cobertores
num leito de cimento ou pedra
disperso o meu verso
no latido crispado de cães vadios
fieis amigos mendigos sem história
sobre todos eles
vence o frio do desalento
do desespero e da miséria
e sobre todos nós
vai vencendo o silêncio
o consentimento cruel
do amor sepultado nas catacumbas
das nossas consciências
só ressuscitando de quando em vez
do frio da indiferença
e a neve cai
cai a neve. cai branca imaculada
como um verso disperso da Natureza
lançando sílabas de silêncio celeste vestidas de glória
mostrando-nos a mesquinhez
do frio do nosso egoísmo infundado
do inverno, para além da sua estação.