Sou um dragão gigante
Solto labaredas de fogo
Palavras que queimam almas
Verdades que iluminam espírito
Silêncios que preenchem
catedrais...
Sou um dragão solerte
Sonso
Fico quieto num canto
Encolhido
Tentando ser menor
Ser inofensivo
Tento pisar delicadamente
no caminho
Respeito pedras,
ervas daninhas.
E, até insetos.
Entendo a parede técnica
reta e pintada
a refletir meus pensamentos
como uma tela imaginária
Muitas imagens.
Algumas músicas.
E, rito irremediável
De sobreviver.
A alavanca diária
do sol nascendo
E as labaredas internas
a inflar, queimar
e das cinzas,
ressurgir
como uma reconstrução dialética.
Sou um dragão.
Pesado por consciência.
Turvo pela lucidez.
Meu olhar de raio-x
mapeia tudo.
Posiciona tudo,
como num tabuleiro de xadrez.
Cada peça.
Seu movimento.
Cada personagem.
Seu valor.
Sua fala e geografia.
As palavras possuem geometria
E a poesia circunferência.
Eixo que as unem.
Traduz a consciência.
Há pessoas, que são Himalaias.
Inescaláveis.
Inatingíveis.
Há pessoas, que são planícies.
E até lacustres.
Baixas, cheias de água.
Ou rancor represado
por frustração ou carência.
São lágrimas, suor e remorsos.
O dragão acessa o Himalaia
e também as planícies.
Voa por cima de tudo.
Voa além
de terras conhecidas.
Chega ao infinito.
E diante do precipício.
Desafia a lógica.
Destrói a metafísica.
Corrompe a dialética.
E, diante do olhar.
Diante do ser.
Da essência da luz
e do mundo.
Pergunta-se:
Quantos dragões há no mundo?
E, baixinho.
Sussurrando ouço:
não muitos,
não muitos.
E, um dia, talvez
deixem de existir...
E sobre a metamorfose
civilizadora.
Parecemos apenas indivíduos
em suas trajetórias.
Sisudos na espaçonave
a navegar em pensamentos
e naufragar em poesias.