SEPULCRO CAIADO

Sabia que o coração bate?

Enquanto isso o meu apanha

Se, se colido, perco o embate

Coincido com a sarjeta mais tacanha

Entrego minha fraqueza

Mesmo sendo à força

Para que essa frieza

Não mais me contorça

Enquanto o repouso alheio

Se faz mundo afora

Ao entorpecimento permeio

Ao raiar que o dia aflora

Como sepulcro caiado

De casca branca epiderme

Fétido sangue espraiado

Abrigador do parasita germe

Sento sobre a tecla do piano

Acabrunhado dos pés à cabeça

As pedras cantam mais um ano

Moroso sem que algo aconteça

Pulo do piano à janela

Entoo o pé espalmado

Salto em posição paralela

Caio como palhaço vaiado

Acordo em retorcido espasmo

Das vísceras do plexo solar

Aguda faca finco ao ventre asmo

Seiva incrua pela rua à jorrar

Denso mar me cerca e cerceia

Afogo as suturas sem mais juízo

Rogo pinima ao male que permeia

Que em cada canto causou prejuízo

Flanar descalço em chão de vidro

Do sano ao insano é mero indício

Sobre o fogo sou carbono anidro

Acromático negrume do malefício

Maledicência da calma jornada

De foice ou espada guerreira

Incompetência da alma jorrada

E foi-se espantada carniceira

Todo circo vira universo

De farsante, arlequim, bufão

De palhaço augusto perverso

Picadeiro do horror canastrão

Todo trapézio é prisma do medo

Todo arco-íris é luz idiossincrática

Toda música óptica, ao ouvido enredo

Todo medo perspectiva auto-estática

Todo conhecimento é ângulo do segredo

Toda arte um aspecto da matéria plástica.