Preciso de razoável destreza
com verbos
Principalmente os mais difíceis
Como correr e corrigir
Preciso de razoável destreza
com pronomes
principalmente
os de tratamento
Nâo chame o papa como se fosse reitor
E nem o reitor como se fosse cônego...
O erro nas hierarquias
fazem desabar escadas.
O degrau é a metáfora
do jogo de poder
Preciso de destreza
Mas nasci
geneticamente desajeitada
grande demais
pernas longelíneas
braços longos
ombros largos para rugby
No mapa da cidade
me desloco
como um soldado em marcha
Miro o alvo
e atiro,
sem perguntar.
Meus passos são dardos
ao infinito.
Perdidos em caminhos
laboriosos.
Foram abolidas expressões
como: com licença,
por favor...
Cadê a civilização?
Não, a egípcia.
Vivemos a truculência
intrínseca
de palavras mínimas,
instantâneas
e de sentimentos
retardatários.
Mas íntimos e afiados.
Vivemos entre farpas
de olhares ríspidos
de críticas cáusticas,
de sarcasmo cirúrgico...
Limamos consciência
Como lixamos unhas.
Como costuramos bainhas.
Limpamos culpa
com a sanitária ilusória
de que somos vítimas
das circunstâncias...
Ainda preciso de destreza.
As palavras na camarinha
semântica
fazem dormir os reais significados.
Tudo que nos resta
são significantes
aturdidos pelos ventos
e tempestades.
Destreza.
Mãos ágeis e habilidosas
Tecem uma história com
palavras e gestos.
Com imagens e sons.
Com cores e luzes.
Com silêncio e poesia.
Tenho a esquerdeza
do lirismo bêbado e
infantil.
E brinco de amarelinha
sem nunca alcançar o céu.