O COVEIRO

Cada manhã, cada novo dia.

Com os olhos carregados de penumbra

e um punhado de pó em cada mão,

Chegas tristemente,

até o torrão de terra que haverás de remover.

Até que uma nova cova

prepares para o funeral à tarde.

A terra te conhece, e a teus passos;

Os pinheiros te conhecem, mas não sorris;

As cruzes são tuas amigas,

Pois sempre as colocas nas sepulturas.

A terra sabe reter fundo o que sepultas.

E cuspir mais tarde o que ainda tem vida.

Homem soturno e sem alegria.

As vêzes paras para acender um cigarro

com teus dedos, ressecos e afilados.

Teus dedos que apartam caveiras,

ossos, vermes, roupas, joias,

algum retrato ou talvez nada.

Algum pedaço de gente, todavia .

As vêzes tu paras e cruzas os braços,

e apoias a cabeça em algum nicho.

E descansas os pés sôbre uma lápide.

Comprendes, homem apagado, que :

Jogas com a morte.

Que rondas a morte.

Que a morte te tem, sem ter-te de todo.

Porém um dia qualquer.

Um dia mais que outros,

Te tocará a morte mais depressa,

Te tocará e tentará enterrar teus passos.

Tu não serás estranho no outro lado,

Lá naquele lugar onde já estivestes,

Nem sentirás, gelado, o primeiro frio.

O frio que os mortos sentem sempre

Quando estreiam suas tumbas.

Nessa noite chiará o morcego.

Aquele que espantavas sempre das paredes.

O que levavas sempre na memória.

O que te fêz tremer aquela tarde.

A terra sentirá em suas entranhas

Um pêso que não têve mais que a momentos,

E estranhará tua calma eternamente.

Nessa noite gemerá mais forte

A cancela de ferro que guarda o cemitério

05/07/07