As casas onde moro
Que casa triste, esta, que não me tem.
Não é tua, não é minha, nem de ninguém.
Quando a adentro vejo o sofá preto imenso a olhar-me com desdém,
mas assim mesmo o vejo e o cumprimento.
Na mesa, apenas o pão nosso de cada dia e o queijo mofado.
Há água quente para se ferver mas não se toma o café.
Na feira foi embora rios de trabalho...
o coração vai tomar banho primeiro, depois a alma e por fim o corpo.
Pobre de alguém que cheio dos vinténs não prova quase nada.
Meu sorriso se esconde envergonhado porque a face dela é baça.
Não sei quem mora comigo ou divide a casa.
Ficam ao meu lado alguns anjos me oferecendo vida
e trazem consigo meu abrigo e aí vejo a outra casa,
farta de tudo, cheia de gente.
Na mesa o pão quentinho chegado agora
e no bule o café pegando fogo,
a meninada correndo alegre quase a derrubar a casa: que alegria!
E quando o sonho acaba a outra casa volta
e a mesa já está posta com o mesmo velho pão e o queijo mofado.
O sono me acalenta, visto-me com o pijama velhinho e me recolho à cama
onde os sonhos me distraem e eu converso com os anjos.
Ao despertar me agradeço por ter-me tolerado
E olhando para Deus, eu, quase acordado, digo-Lhe:
obrigado, Senhor, por mais esse dia farto de esperança,
ainda que com o coração chorado.