BEIJOS VAGABUNDOS

Sou poeta

Eu sou do mundo

a palavra não me assusta

nem golpe de machado

ponta de punhal

ou fio de lâmina

Eu risco a folha do vento

com a língua estratificada

em mil camadas empedernidas

feito escamas reflexivas

dentro da sombra

Hoje,

que a palavra me sangra

levanto as mãos para os céus

deixo escorrer o sentido

pelos cantos frios da boca

e não espero a sobra

Sou feito de mundos

e trago um talho na face

furo de punhal afiado

que faz jorrar o amor

no ângulo fúnebre

da cicatriz

Sou meio vencido

perdido na lupa do tempo

me acho particularizado

no fragmento dessa mancha

que quantifica a palavra

na métrica do abismo

Sou poeta

trago beijos bem vagabundos

amo aqui, ali e acolá

com os braços para os céus

parto na folha de vento

e vou embora

cuspindo palavras